quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Vietnã - sem lenço e sem documento

Vietnã - sem lenço e sem documento








Hanói - Insana mas hospitaleira




Hanói - O trânsito maluco



Hanói - Descanso na calçada




Hanói - Peixaria na calçada





Hanói - Almoço em família na calçada






Hanói - Açougue na calçada




Hanói - Barbeiro na calçada




Halong Bay e as milhares de ilhas




Halong Bay





Sapa - quanta cor!



Sapa - eu quero essa boneca!




Sapa - que alegria!




Sapa - Campos de arroz





Sapa - Única



Sapa - Na concentração




Sapa - No pensamento






O Vietnã foi uma aventura e tanto.

Durante o período em que estive lá constatei que a gente realmente muda alguns paradigmas ao longo da vida. Antes de começar a volta ao mundo, meu conceito de viagem sempre esteve totalmente atrelado a um planejamento prévio intenso, considerando impreterivelmente todas as reservas de hotéis, passeios, passagens...

Durante minhas caminhadas mundo afora percebi como também é legal relaxar e deixar as coisas acontecerem naturalmente, deixando os ventos e as boas vibrações tomarem conta da sua vida e esquecer um pouco os planejamentos severos e as planilhas de Excel.

Minha chegada ao Vietnã foi uma loucura... cheguei em Hanói, sem lenço e sem documento, a noite, sem lugar pra ficar. Mais uma vez, deixei tudo por conta do destino e de Deus! Sempre que opto por viajar desta forma, incrivelmente tudo acaba dando super certo no final. Não foi diferente desta vez.

Meu vôo de Phnom Penh para Hanói tinha uma escala em Vientiane, capital do Laos. A princípio, essa escala me parecia um pouco inconveniente já que o vôo que era pra durar uma hora passou a durar duas horas e meia. Mas a paradinha acabou sendo conveniente e estratégica, coisas do destino! Explico: na escala em Vientiane, acabei conhecendo o Rodrigo, um brasileiro que está morando no sudeste asiático. Descobri que ele era brasileiro porque ele tava usando uma mochila com uma etiquetinha do Brasil. Bem na cara-de-pau fui lá perguntar se o cara era brasileiro... não é que era mesmo! Conversei um pouquinho com ele e em seguida entramos no avião, acabamos sentando longe um do outro e não nos falamos mais durante o vôo.

No vôo de Vientiane para Hanói, sentei próxima a um casal de americanos “bicho grilo”, o John e a Nataly, que também estava sem paradeiro em Hanói. Como estávamos na mesma situação, combinamos de rachar o taxi do aeroporto até o bairro Old Quarter, região onde os turistas costumam ficar na capital do Vietnã. Chegando em Hanói, já estávamos prestes a pegar o taxi quando o Rodrigo ressurgiu das cinzas. “Você quer uma carona? Meu motorista pode te levar até o seu hotel.” Santo Rodrigo. Ainda perguntei se o casal de americanos poderia aproveitar a carona. Duplamente santo Rodrigo. A viagem do aeroporto até o centro de Hanói durou mais de uma hora, o que significa que uma corrida de taxi sairia uma pequena fortuna. Santo Rodrigo, santa escala, santo destino.

Eu e os americanos nos despedimos do Rodrigo e desembarcamos em pleno Old Quarter às 21h, na insana Hanói. Não sabíamos direito nem por onde começar a procura por um lugar pra ficar naquela noite. Foi aí que o John teve uma brilhante idéia: eu e Nataly ficaríamos num café bebendo algo e ele iria procurar um lugar para nos hospedarmos. Santo John! Tudo o que eu precisava nesse momento era alguém para procurar um lugar para eu dormir. O John acabou achando o lugar perfeito para uma boa noite de sono. Um hotel de charme, com um quarto só pra mim, super confortável, com internet no quarto, ar condicionado, TV internacional, banheira hidromassagem, toalhas cheirosinhas e café da manhã incluso. Um paraíso para uma mochileira. Sem dúvida, este hotel foi o melhor lugar que fiquei desde a viagem pela Europa com os “paitrocinadores”.


Como vocês podem ver, tudo começou muito bem no Vietnã. A boa notícia é que tudo continuou dando certo até o final! Como tinha pouco tempo para desbravar o país, resolvi colocar no meu roteiro apenas Hanói – a capital, Halong Bay – a baía de 3 mil ilhas, e Sapa – a região das plantações de arroz e do artesanato.

A primeira impressão de Hanói foi simplesmente caótica! Quando a gente pensa que já viu o trânsito mais louco do mundo na China ou no Camboja, você chega em Hanói e conclui que nenhuma loucura de tráfego se compara ao Vietnã. Dizem que o único páreo para o trânsito do Vietnã é a Índia, que eu ainda não tive a oportunidade de conhecer. As motos são praticamente um enxame de abelhas enfurecidas que surgem por todos os lados e cantos. As buzinas fazem parte do cenário sonoro durante 100% do tempo, a barulheira é simplesmente constante. No começo aquilo tudo é um desespero, estressante, “enxaquecante”. Depois de um dia ou dois dias assim, neste estado de alerta e desconforto, o corpo relaxa e os olhos começam a enxergar a realidade local por trás deste caos.

Em Hanói tudo acontece nas ruas. As calçadas são dominadas pelas motos estacionadas, por gente, por cadeiras, por mesas, por comércio. Todo mundo se alimenta sentado nas sarjetas das ruas, no meio daquela bagunça organizada. Caminhar pela cidade é uma experiência única, é preciso estar atento a todos os lados para não ser atropelado por uma moto, para não atropelar nenhum local sentado na calçada, para não deixar de apreciar esse jeito extasiante de viver.

O povo vietnamita é extremamente nacionalista e orgulhoso de sua identidade. E não é à toa... eles têm uma história de guerras e vitórias que os caracterizam um povo batalhador e muito unido. Desde as tentativas de dominação francesa a chinesa, e inclusive na guerra contra os Estados Unidos mais recentemente, o Vietnã mostrou sua soberania como nação forte e guerreira.

A questão política no país é algo curioso. O Vietnã vive num estado político de dicotomia. Enquanto o partido comunista ainda tem grande influência no país, inclusive é o partido do atual presidente, o capitalismo já é a ideologia que na prática está em plena atividade. Mc Donalds, KFC, Coca Cola estão por todos os lados.

De Hanói parti para Halong Bay, uma das regiões mais famosas e turísticas do Vietnã em função de sua paisagem peculiar. São mais de 3 mil ilhas e ilhotas ao redor de uma baía enorme, mais um patrimônio da Unesco para a minha listinha. Confesso que fiquei um pouco decepcionada com Halong Bay, a paisagem é realmente linda, mas a quantidade de turistas chega a ser infernal. O mais triste é que Halong Bay me pareceu uma terra de ninguém, sem grandes controles ou cuidados com esta beleza natural. Mas de qualquer forma valeu a pena ter ido até lá, o cenário é bonito e acabei conhecendo um monte de gente legal no barco em que fiz o passeio.

Meu último destino no Vietnã foi Sapa, foi também o meu preferidíssimo, entre os top 10 lugares que visitei durante a viagem toda. Para chegar a Sapa é preciso fazer uma viagem de trem que dura 10 horas. Lá fui eu encarar mais um trem. Para a minha grande felicidade, essa foi a melhor viagem de trem de todos os tempos, consegui dormir na maior parte do tempo. Sapa é uma cidadezinha pacata, que vive em função do turismo, do artesanato e das plantações de arroz. Ali vivem diferentes tribos, que se vestem com muita cor e vida, tornando a cidade linda e cativante. As mulheres das tribos vivem em função da venda de seu artesanato, elas lotam as ruas e praças com panos, bolsas, calças e tudo o que se pode imaginar, tudo feito a mão. Tudo o que elas vendem também é colorido, o cenário local é mágico, um prato cheio para as fotografias. As paisagens dos campos de arroz também são belíssimas, degraus e mais degraus desenhados nas montanhas, cobertos de plantações verdinhas. Algo totalmente surreal para qualquer ocidental que ainda não tinha visto uma plantação de arroz. Pra finalizar, Sapa é bem mais relaxada do que Hanói. As buzinas até existem, mas uma lá e outra acolá. Todas aquelas cores vibrantes misturadas com o visual dos campos de arroz fazem de Sapa uma parada obrigatória para qualquer visitante em Hanói.

Pra finalizar, na volta de Sapa ainda passei um dia em Hanói e aproveitei para fazer um curso de culinária vietnamita. Para a minha sorte, eu era a única aluna naquele dia e acabei tendo uma aula particular, com direito a visita no mercado local e tudo. Aprendi a fazer várias comidinhas gostosas, mas a campeã para mim foi a salada de mamão verde!

Aguardem a nova chef Mariana quando eu chegar ao Brasil, vou apresentar meus novos dotes culinários!





quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Camboja, um país que tenta se reconstruir

Chegando no Camboja, fronteira com Tailândia




Marcas do Khmer Rouge


Desespero



Escola-Prisão-Museu Tuol Sleng




Um matinho por um trocadinho




Gente que sobreviveu




Gente que batalha pra sobreviver





O futuro do país






Anghor Wat




Ta Prohm - Angkor




Ta Prohm - Angkor



O Camboja foi sem dúvida o país que mais me chocou durante os últimos 6 meses de viagem. Acredito que pouca gente saiba, mas o Camboja tem uma história recente tristíssima, marcada por um regime de terror que matou aproximadamente 30% da população, um índice absurdo que está bem acima das matanças cometidas durante o governo nazista de Hitler.

Entre os anos de 1975 a 1979 (há apenas 30 anos!), o partido comunista Khmer Rouge assumiu o poder do Camboja depois de quase 5 anos de guerra civil. O líder deste partido comunista, Pol Pot, queria instaurar uma sociedade 100% agrária e igualitária. Para atingir seu objetivo, instaurou um regime comunista totalitário que dizimou a população intelectual do país. No regime Khmer Rouge, não poderia haver nenhuma diferença de riqueza, nem intelectual, nem cultural, nem religiosa. Estima-se que mais de 20 mil professores tenham sido mortos, 90% dos monges budistas e 20% dos médicos do país. Não existe um número oficial de mortos durante o regime Khmer Rouge, mas a conta de óbitos passa dos 2 milhões, sendo que na época o Camboja tinha apenas 7 milhões de habitantes. O pior de tudo é que o regime foi apoiado e financiado pela China durante 4 anos. O período de terror só acabou em 1979 com a invasão dos vietnamitas no país e intervenção tardia da ONU, que demorou demais para agir.

Para entender um pouquinho da história do país, resolvi ler o bestseller do Camboja chamado “First they killed my father”, escrito por Loung Ung, uma sobrevivente do inferno que aconteceu no país. Comprei este livro de um rapaz sem pernas, entre milhares de pessoas na mesma situação que ficam nas ruas tentando vender livros e postais. Confesso que ao ler o livro e entender um pouco do tamanho da ganância do ser humano e da força do jogo de interesses comerciais, acabei ficando meio triste e desiludida com o futuro da humanidade. Ainda assim, recomendo a leitura.

Em Phnom Penh, capital do Camboja, visitei um dos principais campos de concentração onde milhares de pessoas foram mortas durante o regime. Também fui a uma escola que durante o período Khmer Rouge foi transformada em um a prisão. A prisão virou museu e atualmente exibe uma mostra de fotos de diversas pessoas que foram torturadas e mortas ali. Sem dúvida, um programa bem triste, mas indispensável numa visita ao Camboja. Impossível não querer se interar da história do país estando ali tão próximo disso tudo. Impossível não se emocionar, impossível não se revoltar, impossível não se questionar.

O Camboja ainda vive às margens desta história sangrenta e tenta se reconstruir aos poucos. As feridas ainda estão abertas, a pobreza é dominante e generalizada. Ao sair nas ruas, os turistas são abordados por centenas de adultos, crianças e idosos locais clamando por esmolas. Dói o coração. Todos têm uma história triste para contar sobre o período do Khmer Rouge. As famílias permanecem despedaçadas e o país em construção. Desde 1993, o sistema político do Camboja é uma monarquia constitucional, mas quem reina mesmo é a corrupção.

Ainda assim, o Camboja tem uma parte linda que fiz questão de deixar pra contar por último: as ruínas dos templos de Angkor Wat, a maior construção religiosa do mundo! Entre os séculos 9 e 13, esses templos foram construídos em homenagem aos deuses hindus. Falando assim, a princípio parecem ser templos comuns, mas ao visitar Angkor Wat fica evidente a perfeita combinação de magnitude, criatividade e devoção espiritual do povo cambojano. Angkor é enorme, é incrível, é divino. Angkor é uma das coisas mais lindas que já vi na vida. Para visitar esta cidade de templos é preciso ao menos 3 dias completos, mas o ideal mesmo é fazer o desbravamento em uma semana, com calma e disposição para andar debaixo de muito sol. Pra mim, o ponto alto de Angkor foi Ta Prohm, um templo que está sendo literalmente digerido pela natureza, uma simbiose surreal do humano com o natural... árvores e raízes enormes saem pelas janelas e tetos dos templos. Estupendo!

Angkor é o coração e a alma do Camboja, um orgulho nacional para todos os cambojanos que tentam se inspirar nessa obra magnânima para esquecer os anos de terror e trauma no país.

Sem dúvida, o povo é outro grande destaque do país. Fiquei maravilhada com a capacidade desta gente ser solidária e feliz mesmo com uma história recente de dor e tristeza. As pessoas são queridas, são sinceras, são sensíveis. Se apegam a qualquer um que tenha um pouco de paciência para escutá-los. Adoram uma conversa e são simplesmente fascinados pelo Brasil.

Pheng-Kruy foi meu moto-taxista particular durante alguns dias no Camboja. Conversamos bastante, aprendi muito e demos muitas risadas juntos. Contei sobre a vida no Brasil e nossos costumes. Cada vez que contava algo sobre minha vida, ele ficava vidrado escutando. Pheng-Kruy não cansava de dizer que eu era a “chefa” mais encantadora que ele já tinha conhecido. Gostou tanto de mim que na última corrida para o aeroporto me fez um pedido: que eu não andasse mais de moto durante minhas andanças pelo mundo, que deixasse esse posto somente para ele em minhas lembranças. Quanta graça, quanta sensibilidade deste povo sofrido que ficou guardado em meu coração.